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quinta-feira, 2 de setembro de 2010

“Só os mentirosos podem responder dignamente ao amor” by devaneiospsi

O amor há tempos é um problema. E o uso desta palavra refere-se ao conceito de “problematização”, abrindo assim a possibilidade de refletir sobre este tema tão obscuro. Dessa forma, nenhuma tentativa se esboça de encontrar uma saída única, mas o desejo de continuar “falando sobre”, numa exaustiva tentativa de elaboração. Afinal, se o amor é uma ilusão e os relacionamentos amorosos impossíveis, o que nos resta? Há alguns dias, recebi esta resposta: “a criação”. Criação não num sentido sublimatório, onde deixaríamos as trocas amorosas para nos dedicarmos apaixonadamente a outros assuntos, geralmente intelectuais. Mas criação em se tratando do relacionar-se com este outro tão enigmático.

Tal postura pessimista, como diriam alguns, vem de Lacan. Em seu oitavo seminário, sobre o tema da transferência no tratamento psicanalítico, Lacan solta algumas bombas sobre este sentimento. Para o autor, existe uma diferença entre este outro recoberto por nossas fantasias e o ser do outro. Portanto, estaríamos sempre fadados a olhar o outro a partir das nossas lentes e, dessa forma, o outro que se apresenta seria um espelho. Temos aí o que ele chama de agalma, estes objetos que encontramos nos pretendentes e que nos atraem como jóias. O que ocorre é que tais jóias só são assim notadas porque em nós residem, neste Outro que não cansa de nos atropelar. Sim, falamos do Inconsciente, essa outra parte, metade, esse nosso Outro que nada mais é que nós mesmos, a nossa verdade.

O amor assim estaria submetido às fantasias que, para a psicanálise, são sempre infantis. Toda escolha amorosa diz respeito a esse Outro que em nós habita. A complementariedade e a harmonia seriam resultantes de pares cujas fantasias se encaixam. Lacan nos fala sobre a relação sexual inexistente, apontando para o absurdo que é a comunicação entre estes sujeitos, que são sempre Sujeitos do Inconsciente e, portanto, barrados, cindidos, pois seres de linguagem. Uma linguagem que é combinatória e que cada um combina do seu modo.

Retornando ao título, “só os mentirosos podem responder dignamente ao amor”, notamos que é de um Outro que se trata. O amor seria, portanto, uma mentira. A partir disso, a criação. Tomar conhecimento desse caráter ilusório do amor não é necessariamente não mais vivenciá-lo. O amor une, eis aí a função de Eros. Os encontros nunca são os mesmos e, por isso, nos causam, nos transformam. A sacada é amar, “apesar de”. Neste sentido, um amor que inclui a falta do outro e de si mesmo. Um amor que menos cobra, menos exigente. Mais compreensível, menos neurótico.

retirado do blog do Psicanalista Felipe Grillo

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